9 de jan. de 2010

O Carnaval Sergipano: Do Entrudo ao Pré-Caju

Autores: Antônio Wanderley de Melo Corrêa
              Luíz Fernando de Melo Corrêa
              Marcos Vinícius Melo dos Anjos
              Maurício da Conceição Neves
     Foto: Luize Ribeiro

O Carnaval foi trazido para o Brasil a partir de 1008 com a transferência da corte portuguesa para o nosso território. Aqui a festa ganhou estilos próprios, incorporando a musicalidade dos negros e elementos das culturas indígenas.

O Entrudo

O Entrudo foi a expressão mais antiga de festa carnavalesca em Sergipe. Trazida de Portugal para o Rio de Janeiro no início do século XIX se espalhando pelo Brasil, chegando até nossa Província.

Foi na cidade de São Cristóvão e nas Vilas de Maruim e Laranjeiras que o Entrudo foi mais festejado. A festa carnavalesca acontecia, como acontece até hoje, nos três dias anteriores a Quarta-feira de cinzas que marca o início da Quaresma.

As pessoas se divertiam em cortejos de maracatus, ou seja, grupos passeando pelas ruas cantando, tocando tambores e outros instrumentos de percussão e bebendo cachaça. Nesses dias os senhores liberavam seus escravos para poderem participar da festa, esses realizavam batucadas em becos, quintais e terrenos baldios.

Havia ainda a "guerra de limão de cheiro". O "limão de cheiro" era uma bola feita de cera ou parafina contendo água, perfume ou xixi dentro. As pessoas jogavam umas nas outras e todo mundo se molhava, tudo com muita correria, risos e mangações. Esse tipo de brincadeira ainda existe em Japaratuba no Carnaval e na festa de Santos Reis (06 de janeiro), o nome é que mudou, hoje chama-se "Guerra das Cabacinhas" (por terem pequenas cabaças como fôrmas).

O Zé Pereira e os bailes de máscaras

Os passeios ou corridas de "Zé Pereira" foram outra expressão carnavalesca muito popular no final do século XIX. Grupos de foliões saiam pelas ruas e praças tocando cornetas, batendo tambores e cantando num ritmo agitado e alegre, muitos deles usando máscaras e fantasias de palhaço, animais, políticos, diabos, etc. O "Zé Pereira" era uma festa popular, de gente pobre e de escravos. Seu ritmo frenético e muito barulhento atraia até os mais tímidos. O grupo desfilava sem nenhuma disciplina. Os passeios de Zé Pereira dominaram o Carnaval sergipano entre as décadas de 1880 a 1900.

A elite também entrava na farra, não nas ruas, mas nos salões fechados das residências luxuosas. Por influência francesa eram realizados os disputados bailes de máscaras, onde chovia confete e serpentina. As fantasias eram cuidadosamente elaboradas, não faltando o brilho de lantejoulas e paetês. Os motivos das fantasias quase sempre obedeciam os padrões e costumes europeus: Pierrôs, Colombinas, Arlequins, Piratas, etc.

Os Clubes Carnavalescos

Entre o final do século XIX e a década de 1920, no carnaval sergipano se destacaram os blocos e clubes. Em Laranjeiras existiam os mais ricos blocos e clubes carnavalescos de Sergipe, a exemplo do "Minerva", com foliões ostentando fantasias luxuosas e deslumbrando os expectadores acostumados a vida pacata.

O Carnaval de Laranjeiras era bem divulgado e comentado nos jornais de Aracaju, o que veio estimular a formação de blocos e clubes também na capital.

Em 1894 o tenente Henrique Silva organizou em Aracaju o primeiro grupo de foliões, que desfilou pelas ruas arenosas da capital ao toque de cornetas e zabumbas. No ano seguinte já existiam dois clubes: O "Mercuriano" e o "Cordovício". O "Mercuriano" era organizado por comerciantes e comerciários ( na Roma antiga o deus do comércio chamava-se Mercúrio), suas cores eram o azul e o vermelho, possuía ricos carros alegóricos puxados por animais e enfeitados com flores, nos quais desfilavam mulheres belas e sensuais. O "Cordovício" também desfilava com belíssimos carros e um grande número de foliões trajando fantasias criativas e originais.

Em 1903 surgiram novos grandes clubes carnavalescos em Aracaju: o "Arranca" e os "Filhos de Baco". A partir daquele momento o Carnaval aracajuano já superava o laranjeirense. Aracaju já se impunha como o principal centro urbano do estado de Sergipe. O "Arranca" era um clube popular enquanto os "Filhos de Baco" tinha a participação de famílias ricas.

Os desfiles aconteciam na rua Pacatuba até a frente do Palácio do Governo. Milhares de pessoas assistiam a passagem dos blocos, com seus magníficos carros alegóricos e ricas fantasias.

Nos desfiles, os clubes faziam críticas à política da época, dominada pela corrupção e a violência, o que provocava aplausos, gritos e gargalhadas da multidão espremida nas calçadas. Outros temas dos desfiles dos clubes eram a natureza, deuses da Grécia antiga, os astros, navios, etc... O carnaval fazia o povo desabafar, fugir do tédio do dia-a-dia e esquecer o sofrimento por três dias.

Os grandes desfiles de blocos com carros alegóricos, sofreram declínio a partir de 1915, quando o Carnaval aracajuano foi fechando-se nos clubes e salões da elite a exemplo do Cine Rio Branco. Mesmo assim o povo nunca deixou de brincar o Carnaval, a festa da alegria, do prazer, da musicalidade e da sensualidade.

O carnaval não pertencia a ninguém, era do povo, era de todas as classes sociais. A elite e a classe média festejava nos desfiles de blocos e nos bailes dos clubes. O povo vindo dos bairros operários assistia com entusiasmo aos desfiles, vaiando, aplaudindo e cantando.

Também eram organizadas bandinhas e charangas para os passeios de "Zé Pereira" pelas ruas arenosas da pequena capital. Grupos de foliões realizavam batalhas de confete, serpentina e lança-perfume. Quase todo mundo entrava na folia.

O Carnaval no interior

Nas últimas décadas do século XX o Carnaval sergipano manifestou-se através de desfiles de escola de samba, de blocos, de trios elétricos, etc.

Em Neópolis acontece um dos maiores Carnavais de Sergipe, uma festa com influência pernambucana, com muito frevo, bandinha de Zé pereira e blocos de fantasias.

Em Pirambu o Carnaval segue mais o estilo baiano, com trios elétricos tocando na praia e realizando "arrastões" pela orla marítima ata as ruas da cidade.

Em Ribeirópolis acontece a tradicional "festas das caretas" na qual centenas de foliões percorrem as ruas da cidade, alguns vestidos de mulher, outros usando máscaras horrendas, tocando zabumbas e "assustando" os transeuntes.

O Carnaval também é muito animado em Tobias Barreto e na praia do Abais (Estância).

O Carnaval em Aracaju

Ao longo das últimas décadas (1970 - 1990) o Carnaval aracajuano existiu em diversas expressões: desfiles de escolas de samba e de blocos, bailes carnavalescos nos clubes (Cotinguiba, Iate, Associação Atlética e o Vasco), concursos de músicas e o Carnaval de rua.

Ficaram famosos os bailes do Hawai, do Tricolor, do Almirante dos Artistas e das Atrizes. Nos desfiles de rua destacaram-se as escolas de samba Império Serrano, Império do Morro, Império do Samba, Acadêmicos do Samba, Brasil Moreno, Tubarão da Praia, etc. e entre os blocos destacavam-se Italianas, Bebé, bloco da Paz, Rebu e Fera.

Haviam também os desfiles de foliões em carretas e nos famosos "calhambeques", carros usados, geralmente sem capotas, fantasiados de desenhos com frases cômicas e propagandas comercias. No final dos bailes dos clubes, no amanhecer da Quarta-feira de Cinzas os calhambeques com seus ocupantes se dirigiam para a praia de Atalaia onde acontecia a perigosa e divertida "Corrida dos Calhambeques" na qual os carros realizavam os "pegas" e manobras arriscadas como os "cavalos de pau".

Também na quarta-feira de Cinzas acontecia o célebre e concorrido encontro das bandas rivais do Iate clube de Aracaju e do Cotinguiba Esporte Clube nas proximidades da praça Inácio Barbosa.

Na atualidade, o Carnaval aracajuano acontece ao som de trios elétricos nas manhãs de sol na praia de Atalaia e na praça dos mercados centrais, o famoso "Clube do Povo", no qual dezenas de milhares de pessoas dançam ao som de bandas que se apresentam no palco. Acontece também a eleição e aclamação e do Rei Momo e da Rainha do Carnaval que recebem do prefeito a "chave da cidade".

O PRÉ-CAJU

Em 2002 o Pré-caju (Prévia Carnavalesca de Aracaju) completou dez anos de existência. Ao longo desse tempo essa grande festa carnavalesca foi se tornando cada vez mais democrática. Multidões de dezenas de milhares de pessoas assistem os cortejos dos blocos e trios elétricos nas avenidas de trajeto, nas arquibancadas e camarotes do "corredor da folia". Os blocos de foliões estão cada vez mais numerosos e diversificados a exemplo dos blocos "oficiais" que desfilam ao som do "axé music"; os blocos "alternativos"; grupo de Zé Pereira de Neópolis, com seus clarins; "Bloco da Prevenção", formado por centenas de agentes de saúde distribuindo camisinhas e conscientizando a população sobre o perigo das doenças sexualmente transmissíveis e aids; bloco de idosos; blocos de crianças e adolescentes; cortejos de grupos folclóricos do interior do estado; "Bloco Arco-Íris" reunido homossexuais, travestis e simpatizantes, os "Cajuranas" contando com a participação de homens fantasiados de mulher, e o seu antônimo "as Machuranas", mulheres fantasiadas de homens; trios elétricos com cantores e músicos sergipanos cantando e tocando forró acompanhados por quadrilhas juninas. A "pipoca" é a parte dos foliões que não tem acesso aos blocos, que acompanham os trios elétricos fora dos cordões de isolamento.

Bibliografia:

CORRÊA, Antônio Vanderley de Melo et alli. Sergipe: Sociedade e Cultura. Aracaju: Ed. do Autor, 2006 (adaptado)

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